No sonho se mede o encanto Que me dá esta alegria A saudade só me chama Quando a noite se faz dia As estrelas já eu sei Que são luzes pequeninas Como os ciganos que cantam Dia e noite as suas sinas Tenho o nome de uma pedra Sou cascalho e vivo só Passei toda a mocidade Em casa de minha avó Tinha fruta no quintal Duas videiras verdosas Um eucalipto crescido Ao pé de um vaso de rosas Bebi água em muitas fontes E vi estrelas lá no céu Todavia sou pastor Dum gado que não é meu Sonhei guitarras e guizos Ouvi poetas nas vendas Cantando a vida dos pobres Com os seus vícios e lendas Comi uvas, bebi vinho Vi lagartos e lebrões Andei com velhos malteses Assassinos e ladrões Dormi a sesta nos montes Levei porcos ao Barreiro Andei nas feiras guardando O meu gado o ano inteiro Lá nas moitas aprendi A ser aquilo que sou Um camponês que não pensa Nas coisas que já pensou Da macela faço o chá E da esteva faço a cama A hortelã tira o sarro Aos frutos verdes sem rama Agarro a névoa aqui perto Nas margens de uma ribeira é na saudade que sinto Que mato a minha canseira Montei cavalos de Alter Vi galgos de Montemor Saltei valados e rios E compuz versos de amor É na lonjura que eu gozo O vento que vem do céu Todavia eu sou pastor De um gado que não é meu