17h57 da tarde O céu ficou escuro mais cedo O olhar de quem passou viu Quem passava por ali ouviu O barraco de Seu Francisco E o momento que ele explodiu Mas não tinha só ele lá Tinha um pedaço dele lá O amor que nunca mais viu, o registro no civil Tudo que ele construiu Em um segundo o fogo engoliu O desespero bate forte O rosto claro, a visão embaçada Foda-se o tanto de conta paga Que Deus queime tudo que eu tenho Mas tem um pedaço meu lá O aumento da pressão Pobre sem seguro de ninguém Sem água, sem bombeiro Seco, perdendo tudo que tem Só o choro no olhar Ah, e se é assim que Deus quer Pra mim tá tudo bem Mas eu vou salvar o que eu puder Sem precisar da ajuda de ninguém Faz por ele mermo' Tá queimando? Deixa arder Ser pobre não é uma escolha, é só fato Não é o primeiro nem o último também Seu Francisco não deixou o gás ligado Porque nem gás seu Francisco tem Seu Francisco não deixou a luz acesa Ele sabe quanto a conta vem As favelas mais bem localizadas São as que mais sofrem com incêndios A especulação imobiliária Você vai receber os seus amigos Você quer morar próximo de uma favela? Você pode reparar, as favelas que mais pegaram fogo Nos últimos anos em São Paulo São justamente as mais bem localizadas da cidade A especulação imobiliária Ela é água que mata a minha sede A paixão que arde no meu peito Como se tudo que eu tenho fosse as roupas do corpo E a doce lembrança do beijo Sem reclamar agradeço Dobro os joelhos, tô vivo ainda Seu Francisco já tá acostumado a renascer das cinzas E dar a volta por cima Se liga bem antes que chegue o bombeiro Primeiro, ligeiro, já vejo a mídia A gente precisa de água Mas o repórter só vem pra jogar gasolina Analfabeto sem teto que já viu de perto Um pouco do fogo do inferno Não sabe explicar ao certo Qual é o valor que dão pra sua vida Se localiza onde desvaloriza O setor imobiliário O playboy não quer olhar pra baixo Da sua cobertura e ver um monte de barraco Se procriando com os ratos Esgoto, material reciclável O incêndio começou planejado Pela polícia nunca investigado Saudade é o que sobrou de nós Não apague essa chama Histórias quentes como o fogo Na cozinha e na cama Dizem que quem perde o teto Ganha as estrelas, essa é minha rua Eu deito a cabeça, eu nunca me esqueço Antes de dormir eu apago a Lua Boa noite